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El Niño perto do fim?

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Mês de julho deverá ter chuvas dentro ou até mesmo um pouco abaixo do normal
Mês de julho deverá ter chuvas dentro ou até mesmo um pouco abaixo do normal - Foto: Jorge Barros Iglesias
Por JOSSANA CERA

Junho com temperaturas muito acima da média

O sexto mês do ano foi marcado por um bloqueio atmosférico, ou seja, um sistema de alta pressão atmosférica manteve o tempo seco na maior parte do Estado, impedindo que as frentes frias avançassem. Com isso, o acumulado de precipitação não passou dos 50 milímetros (mm) na metade norte do Rio Grande do Sul, mas chegou aos 239 mm em Santa Vitória do Palmar (Imagem 1 A). Assim, todas as regiões arrozeiras do RS ficaram com precipitação entre 50 e 100 mm abaixo do normal, exceto a Zona Sul, que registrou precipitação de até 200 mm acima do padrão normal para o mês (Imagem 1B).

No entanto, o maior destaque ficou por conta das temperaturas, muito acima da média climatológica. Como o bloqueio atmosférico reteve as chuvas no Uruguai e extremo Sul gaúcho, as demais regiões tiveram aumento significativo e duradouro nas temperaturas. Em média, a temperatura mínima variou de 12 a 14°C, cerca de 4°C acima do normal.

Já a média da temperatura máxima variou de 22 a 24°C, ficando até 5°C acima do padrão normal. Em virtude disso, foram observados alguns dias do mês com temperaturas superiores aos 30°C. Este padrão é um pouco fora do normal, no entanto, não é raro de ocorrer durante invernos sob a influência do fenômeno El Niño, mesmo que este seja de intensidade fraca.

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Imagem 1 - Foto: Reprodução

Imagem 1: Mapa da precipitação acumulada (A) e anomalia da precipitação (B) durante o mês de junho de 2019. As escalas de cores indicam o acumulado de precipitação em mm (A) e anomalia de precipitação (B), também em mm, onde valores positivos (azul) indicam precipitação acima da média e valores negativos (laranja-vermelho) indicam precipitação abaixo da média. Fonte de dados: CPTEC/INMET.

Situação atual do fenômeno ENOS (El Niño-Oscilação Sul) e perspectivas

O El Niño está em fase final, mas seus efeitos ainda deverão ser percebidos, ao menos até outubro. Em boletim divulgado do dia 11/07, o Centro Americano de Meteorologia e Oceanografia (NOAA), diminuiu a chance de El Niño para 40%. Em contrapartida, a chance para voltar a um período de Neutralidade subiu para 60%.

No mapa da anomalia da temperatura da superfície do mar (ATSM) observa-se que a região do Oceano Pacifico mais aquecida é a mais central, chamada de Niño3.4 (Imagem 2). Na região próxima à Costa do Equador, chamada Niño1+2, as águas estiveram com anomalias mais frias, o que corrobora com a deficiência de chuvas no sul do Brasil em junho. Esta característica deve continuar nas próximas semanas, já que as águas subsuperficiais estão sustentando este resfriamento.

E o que isso quer dizer? Quer dizer que, possivelmente, não se terá chuvas tão volumosas e expressivas nas próximas semanas. Ou seja, julho deverá ter chuvas dentro ou até mesmo um pouco abaixo do normal.

Voltando a falar das águas subsuperficiais, as anomalias positivas de temperatura, que vinham ocorrendo desde março de 2018, perderam bastante intensidade no último mês e, em compensação, anomalias negativas surgiram e se expandiram. Foi este fato que fez com que as atualizações dos modelos diminuíssem a tendência de continuação do El Niño e trouxessem a maior probabilidade da volta da Neutralidade climática para o período da primavera e verão.

As águas quentes do Oceano Atlântico Sul voltaram a se intensificar em junho, podendo este fator compensar, em alguns momentos, as anomalias negativas de temperatura da região Niño1+2. Porque isso? Porque enquanto anomalias negativas de temperatura no Niño1+2 diminuem as chances de chuva no Rio Grande do Sul, anomalias positivas de temperatura no Atlântico Sul aumentam as chances e a qualidade das chuvas por aqui. É como um cabo de guerra entre duas forças!

Baseado nisso, pode-se delinear alguns cenários:

Se a região Niño3.4 permanecer com viés positivo: há maior probabilidade de a primavera e verão serem levemente mais úmidos, com chuvas entre o normal e pouco acima da média em alguns momentos.

Se a região Niño3.4 voltar totalmente à Neutralidade: as previsões ficam prejudicadas, pois neste padrão, outros fenômenos terão influência maior e, para estes, só se consegue fazer a previsão com menor período de antecedência. Mas estiagens e/ou cheias pontuais podem ocorrer!

Se a região Niño3.4 voltar totalmente à Neutralidade, mas ficar com viés negativo, ou seja, águas ligeiramente mais frias: as chances de estiagens pontuais aumentam, sobretudo em regiões como a Fronteira Oeste, Campanha e Zona Sul que, climatologicamente, chove menos durante o verão.

Qual a recomendação? Ficar de olho nas próximas atualizações da previsão climática, pois estamos em período de transição entre duas fases do fenômeno El Niño-Oscilação Sul, da fase El Niño para a fase Neutra!

Com relação às temperaturas, o padrão para o restante do inverno é de que as médias fiquem ligeiramente acima do normal. Como mencionado no boletim anterior, incursões de massas de ar polar ocorrerão, no entanto não serão duradouras. Não se descarta a possibilidade de massas de ar frio ingressarem no Estado em agosto e setembro, sob o risco de geada tardia. Mas, por enquanto, não há expectativa de uma nova massa de ar polar tão intensa como a que ocorreu no início de julho.

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Imagem 2 - Foto: Reprodução

Imagem 2: Anomalia da Temperatura da Superfície do Mar no mês de junho de 2019. Fonte: Adaptado de CPTEC. O retângulo na Imagem mostra a região do Niño3.4, região que os centros internacionais utilizam para calcular o Índice Niño (índice que define eventos de El Niño e La Niña).

Previsão para a precipitação para o trimestre Jul-Ago-Set

O modelo climático do INMET/UFPel mostra que em julho (Imagem 3 B) as chuvas ficarão dentro do normal na maioria das regiões e abaixo do normal no setor norte/nordeste do estado. Para agosto, este modelo indica chuvas abaixo do normal em todas as regiões, sendo que na metade sul os valores ficariam -25 e -50 mm (Imagem 3 D). Já para setembro, o modelo indica chuvas dentro do normal para toda a metade sul do Rio Grande do Sul (Imagem 3 C).

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Imagem 3 - Foto: Reprodução

Imagem 3: Normal Climatológica (A,C,E), anomalia de precipitação INMET/UFPel (B,D,G) para os meses de julho,agosto e setembro de 2019, respectivamente, para o Rio Grande do Sul. Fonte: Adaptado de CPPMet-UFPel/INMET.

Outros modelos (CPTEC-brasileiro, INMET-brasileiro, IRI-americano, CFS-americano) mostram que entre agosto e setembro haverá possibilidade de se ter alguns momentos com menor ou nenhuma precipitação, ou seja, estiagens curtas, com 15 a 20 dias de pouca chuva. Por um lado, isso é bom, pois o produtor terá um último momento para realizar os preparos de solo antes de iniciar a semeadura da safra 2019/2020.

No entanto, a partir de novembro/dezembro, as chuvas poderão ficar mais irregulares, devido à aproximação do verão (chuvas de verão, localizadas) e devido à Neutralidade. Com isso, ressalte-se ter atenção redobrada com os reservatórios de água para a safra 2019/20, pois se tem o risco de ocorrência estiagens regionalizadas durante o verão.

Jossana Cera é meteorologista, doutora em Engenharia Agrícola pela UFSM e consultora do Irga

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